sábado, 21 de novembro de 2009

De pernas cruzadas



Sentou-se e cruzou as pernas.

O salto fino dava idéia de seu estado: um pé no chão, outro pronto para voar, para quaisquer das direções que o bico apontasse. Era uma questão de movimento. Ou de chamar a atenção. A verdade é que tentava disfarçar intenções, enquanto o café levantava com o vapor o pensamento. Quente e forte, como o líquido preto. Aquela altura, era mais fácil silenciar o desejo em pequenos goles. Como quem espanta o sono para adentrar a madrugada.

Buscava olhares. Insinuava discrição. Gritava por mais.

Trocou de perna e o movimento logo foi percebido. Mas, somente o garçom veio oferecer-lhe outra xícara. A oferta era pouco, mas aceitou. Aquela altura, era difícil engolir todas as vozes, vontades e inquietações contidas no copo, no corpo. O coração, cansado de enganar-se, procurava novas promessas, ditas sussurradas, devagar, com aquela sinceridade que aponta o caminho. A porta para sair. Ou entrar.

Mas o sabor daquele canto de sala parecia acomodar, em pequenas almofadas, os ideais de uma vida.

E ficou ali, sentada.
Perpassando pernas, ajustando a saia, adequando sentimentos.
Estacionada.
A pensar com seus sapatos. Ganhando tempo. Perdendo sonhos. Enquanto o café esfriava sem lhe trazer a boca o calor do amargo. Do doce. Do gosto.

4 comentários:

Marcelo Tavares disse...

Texto gostoso da bexiga... Massa, muito massa.

Erika Zuza disse...

Oi Sara, obg pela visitinha... claro q pode me linkar sim hehe... vc já ta linkadinha! abção! =)

Michelle disse...

Impressionante tua escrita... forte, ácida e ao mesmo tempo doce.. cheia de sol raiando.
minha escritora favorita!
beijos

A Princesa do Castelo disse...

Lindooooooooo!