terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Linguagem fácil a do abraço


Usava os braços para se comunicar. Desde pequena foi iniciada nesta arte de buscar mãos, pulsos, cotovelos e ombros para sentir o que cada contorno tinha a falar. Afeita a palavras e toda sorte de construções, o que mais lhe encantava, no entanto, era decodificar a estrutura física, rica e completa em expressar mais do que arranjos gráficos, desnecessários e sem calor. A anatomia poética desde a clavícula até as falanges insinuava a graça de mover mundos - mesmo quando estes giravam em silêncio. Gostava de descobrir o cheiro e a semântica em cada abraço. Os membros superiores estendidos da mãe a lhe envolver, depois de esfolar o joelho (ou quando acordava no meio da noite), exalavam fonemas de paz. Naquele turbilhão, auscultava versos e cantigas vindas da palma da mão. Já era ciranda. Na mesma espécie de estrutura aberta e coerente do pai encontrava chão, mesmo quando o discurso não tinha concordância e asperava prolixo. Linguagem fácil a do abraço. Lágrimas nunca foram suficientemente resistentes a eles. Suspeito que bocas e corações também não. O ritmo e a intensidade em que os braços passeiam fazem saber as intenções. Verbete farto de conotações. Aquecem. Apertam. Se acham. Consolam. Se largam. Comemoram. Crescem. Erguem. Reencontram. Despedem. Educam. Amam. Falam por si só. Um dicionário cheio. Plural. Preenche qualquer vazio. O mundo poderia ser mudo e iletrado e ainda assim, ficar ali, entregue, proseando com o silêncio dos abraços.

2 comentários:

Marcelo disse...

Texto fuderoso. Vontade de tirar você pra dançar...

Debora disse...

Abraços... Não existe nada melhor. Quando bem dado, cria um vínculo impossível de se quebrar.. :)


Saudades da minha amiga..
;**